terça-feira, 28 de novembro de 2006

"Quando padre não tem esposa, tem marido"

















 
Má conduta sexual: Padre
Jaime é acusado de mentir para se casar e

pode ser expulso da Igreja Católica
 















Denuncia
à OAB:
em depoimento, suposta mulher do padre
diz que sofreu ameaças e conta como foi enganada por Jaime.
O processo

corre em segredo de Justiça






“Eu
era escrava sexual
"










 


















Denúncia
Confissões
da

mulher do padre
Pela primeira vez no Brasil, uma fiel

pede na Justiça o reconhecimento e

a anulação de sua união com um

sacerdote. A disputa envolve sexo,

agressões e mentiras
Por Alan Rodrigues – do Recife

“Assim que acabou a missa da noite, fomos para a sacristia.
Ficava a poucos metros do altar, onde deixávamos os objetos
do culto e as oferendas. De repente, o Jaime trancou a porta. Arrastou-me
com força. Despiu-me rasgando meu vestido. Ele, então,
lançou-me sobre a mesa jogando no chão os castiçais,
o cálice e até a Bíblia; rompeu os
botões de sua batina e fez sexo comigo. Estávamos
juntos há cinco anos, mas aquele foi o momento mais profano.
Eu não queria, mas não consegui me desvencilhar de
seus braços. Com o corpo dele sobre o meu, apenas mirei uma
grande imagem de Jesus, ladeada a uma foto do arcebispo de Pernambuco,
pregada na parede branca. Rezei. Implorava para que aquele inferno
terminasse. Jaime uivava. Depois, me largou em prantos. Pedi perdão
a Cristo. Aquela, defnitivamente, não era a vida que eu pedira
a Deus.”


Todo santo dia, a pernambucana Renilda Maria da Silveira, 42 anos,
dedica parte de sua vida a escrever a respeito de um pecado que
ela jura não ter cometido. Depois de três anos vivendo
sob o mesmo teto com Jaime Alves de Melo, ela descobriu que seu
companheiro, na verdade, era um padre católico. A primeira
reação de Renilda foi de fúria e ódio.
Imediatamente, ela resolveu denunciá-lo à Igreja.
A Cúria exigiu que Renilda tivesse provas concretas de que
o padre tivesse tido, no jargão da instituição,
“uma má conduta sexual”. Corria o ano de 2001.
Para provar o que dizia, Renilda resolveu arquivar sua ira, continuou
sua relação com Jaime por mais três anos e,
nesse tempo, montou um assombroso pacote de provas para pedir a
excomunhão da Igreja Católica de seu “marido”.
Nesse período, juntou filmes, fotografias e gravações
de suas relações íntimas e familiares com o
padre Jaime. Foi fria e calculista. Freqüentou praia de nudismo,
participou, a convite dele, conforme conta, de orgias, realizou
o ato sexual na sacristia da paróquia da Assunção
de Maria, em Olinda (conforme descreve no relato que inicia esta
reportagem), e também na casa paroquial. Ela quer provar
que, além de mentir para ela, quando não assumiu sua
condição de padre, Jaime, ao abrir o jogo, passou
a ser perverso e absolutamente profano.









Album de família: imagens
que podem comprovar a união estável entre o padre Jaime e Renilda.
No alto (à esq.) o casal a caminho da praia. Abaixo
desta (à esq.), em solenidade religiosa. No alto (à
dir.
), na comemoração de seu segundo sacerdócio em um restaurante
do Recife. À direita com o arcebispo dom José, que o afastou

Todo esse escândalo, tratado até aqui como segredo
de confessionário pela cúpula da Igreja pernambucana,
ganhou as ruas, altares e os tribunais. Há 15 dias, Renilda
entrou na Justiça dos homens com um processo de reconhecimento
e dissolução de sociedade de fato. Traduzindo, o fim
do casamento, na prática, com o padre. O processo nº
043730-9, que tramita em segredo de Justiça na 8ª Vara
de Família no Fórum de Recife, é o único
do tipo de que se tem notícia no Brasil. “Não
tive opção. Eu me submeti a viver como uma escrava
sexual e uma refém para que eu pudesse desmascará-lo”,
diz. “Vou conseguir”, garante.


Batalha judicial


Noutra frente, Renilda está pelejando dentro da Igreja.
Em 2004, três anos depois de suas primeiras denúncias,
o arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife dom José Cardoso
afastou o sacerdote Jaime de sua Arquidiocese. Proibiu-o até
de usar batina ou “qualquer outro distintivo clerical”,
conforme determinação de um decreto assinado pelo
arcebispo José em 22 de setembro daquele ano. Porém,
em razão de ações que só a Justiça
divina é capaz de explicar, o padre Jaime conseguiu, com
a autorização de outra arquidiocese, continuar celebrando.
Hoje, ele é padre na cidade de Inajá, interior de
Pernambuco, reza missas, entrega hóstias e ouve confissões.
“De fato ele teve um problema, mas a Igreja prevê o
arrependimento e nós demos a ele essa oportunidade”,
disse a ISTOÉ dom Adriano Ciocca Vasino, bispo responsável
pela região em que Jaime atua, a de Floresta, no interior
de Pernambuco. Renilda sente revolta ao saber que Jaime tem poderes
para ouvir confissões. “Em Olinda, soube que ele seduziu
muitas mulheres a partir do momento em que conheceu os seus segredos”,
diz Renilda, que fora secretária da paróquia em que
Jaime atuava.









Templo maldito: seminário
da Sé onde o padre Jaime se formou

O caso do padre Jaime é emblemático de uma situação
que, muitas vezes, incomoda os padres, mas que ainda é um
dogma católico: o celibato. Pesquisas internas da Igreja
Católica apontam que 5.500 padres brasileiros, ou seja, 32%
deles, desobedecem ao voto de castidade que o celibato implica.
No resto do mundo, esse número chega à casa dos 150
mil religiosos. O problema da vida amorosa do clérigo católico
bate cada vez com mais força às portas da Santa Sé,
no Vaticano. Na quinta-feira 16, em reunião inédita,
o papa Bento XVI encontrou-se com 20 chefes de departamentos do
Vaticano para decidir sobre o tema. O resultado foi a ratificação
da tradição católica, instalada a partir do
distante ano de 1139. Em resposta, os ex-padres católicos
que vivem ao lado de suas mulheres, defensores da modernização
da Igreja, marcaram para os dias 8 a 10 de dezembro uma megamanifestação
– com as respectivas esposas – em Nova York, para chamar
a atenção do mundo para o problema.


Enquanto isso, aqui no Brasil, Renilda ainda vai sendo tratada
como uma herege. Sua mãe, num primeiro momento, a renegou.
Uma mulher de rígida moral católica, afinal, não
poderia conviver com uma filha casada com o padre. Devota de Santo
Antônio, Renilda caiu em desgraça e parou de freqüentar
missas. Hoje, vive à base de doses cavalares de calmantes
e, ainda por cima, como nos tempos da Inquisição,
é acusada de “pecadora” nas ruas do Recife. “Eu
nunca pude imaginar uma coisa dessa”, disse ela a ISTOÉ.


A história de Jaime e Renilda começa em 1998. Aos
38 anos, ela era uma líder comunitária que começava
a despontar no Recife e ele, nove anos mais novo, um suposto estudante
e representante comercial muito interessado em cidadania e na defesa
das causas populares. Nascido em Garanhuns, no agreste pernambucano,
em 1972, Jaime tinha tudo do namorado chamado bom partido. Bonito,
bom de conversa, formado em psicologia e filosofia, o jovem não
demorou muito para conquistar a militante comunitária Renilda
– que já era mãe de uma filha –, pessoa
de perfil guerreiro, mas frágil e carente. “Diante
das pessoas da comunidade, eu não podia chorar, eu tinha
que ser a Renilda corajosa e forte. Com o Jaime não, eu pude
mostrar meu lado frágil, meu lado decepcionada. Hoje, eu
percebo, ele soube explorar minhas fraquezas”, admite. Um
ano depois de se conhecerem, ela não resistiu a um rosário
de palavras que fazem bem ao coração e se entregou.
Tudo no melhor estilo romântico, depois de uma bela massa
italiana regada ao sabor e às emoções de um
bom vinho tinto. Não demorou 24 horas para que ele ocupasse
o lado direito da cama de casal, vago há dez anos, desde
que ela se separou.


Bom partido


Jaime, conta Renilda, era um marido acima de qualquer suspeita.
Dividia as contas com facilidade, fazia o supermercado, bancava
cursos de línguas para a mulher e gostava de caprichar no
churrasco e na cerveja gelada nos finais de semana. Despertava às
cinco da manhã para enfrentar a labuta e retornava a casa
pela noite. Vaidoso, Jaime praticava caratê e adorava correr
pela praia para manter o corpo em forma. Renilda, a princípio,
não tinha o que reclamar da união – até
uma plástica em seus olhos Jaime tinha financiado. A lua-de-mel,
porém, durou até a primeira mentira, em abril de 2001,
quando Renilda descobriu a farsa do falso leigo. Ela foi ao carro
retirar as compras do mês. No porta-malas havia uma caixa
dourada que chamou sua atenção. “Pensei que
era um presente surpresa”, lembra. “Quando abri o embrulho
vi uma batina linda dentro. Na hora me zanguei, porque achava que
ele me enganou e estava ensaiando quadrilha e não tinha me
contado. Perguntei:


– Jaime, o que é isso?

– Ele respondeu: é isso mesmo, uma roupa de sacerdote.

– Mas o que ela está fazendo aqui?

– É minha.

– Como assim?

– Eu não vou mentir para você. Essa é
mesmo uma roupa de padre. Eu sou um padre e vou completar dois anos
de sacerdócio.


O mundo desabou naquela hora. E mesmo assim eu não acreditei.
Ele, tranqüilamente, enfiou a mão na carteira e mostrou-me
a identidade de

religioso”, conta Renilda.


A descoberta de que o homem que tratava como marido era um padre
transformou a vida de Renilda em verdadeiro purgatório. No
início, chegou até a cogitar a possibilidade de fazer
vista grossa a tudo o que descobrira. Afinal, embora não
vivesse um conto de fadas, possuía ao lado de Jaime uma situação
financeira confortável, algo muito além da miséria
da infãncia. Para decidir levar suas denúncias adiante
pesou o fato de ser uma católica praticante, o que lhe impunha
uma autocondenação. “A possibilidade de não
mais comungar com a consciência tranqüila me aterrorizava”,
lembra Renilda. Ela conta que em nenhum momento Jaime pediu perdão.
Pelo contrário, o padre teria tentado convencê-la de
que a situação vivida por ambos era quase normal.
“Ele falou que quando padre não tem esposa, tem marido”,
disse. O padre, segundo Renilda, não aceitava a possibilidade
de separação e passou a ameaçá-la, dizendo
que espalharia pela comunidade que ela era uma prostituta. Apesar
das ameaças, Renilda levou o caso ao bispo e nesse momento
começou a segunda parte de seu drama: teria que continuar
vivendo com o “marido” como se nada de anormal estivesse
ocorrendo, apenas para convencer o alto clero de que suas afirmativas
eram verdadeiras.


Sexo e mentiras


Enquanto juntava provas contra o padre, Renilda viveu momentos
de pura loucura. “Concordei até em participar da celebração
de nosso próprio casamento. Ele

chegou com um buquê de lírio branco, um cálice,
hóstia e uma Bíblia. Vestiu a

batina, trouxe-me uma camisola linda e fez nossa união”,
relata. Renilda conta que com o passar do tempo o comportamento
do padre se tornou cada mais mais promíscuo. Nas viagens
que o casal fazia, por exemplo, Jaime alugava casas com amigos onde
era feito sexo grupal, inclusive com acessórios eróticos.
“Era uma promiscuidade total”, confessa.


Quase mensalmente, Renilda voltava ao bispo para reafirmar suas
denúncias. Mas, segundo ela, a cada visita o bispo exigia
novas provas. “Em 2004 cheguei a entregar comprovantes mostrando
que o endereço dele era na minha casa. Até uma fita
de vídeo com a gente nu na minha cama foi entregue”,
afirma. Foi a cartada final. As denúncias surtiram efeito
e Jaime foi afastado da Arquidiocese de Olinda e Recife. Ele assumiu
um novo posto em outra comunidade a 500 km da antiga paróquia.
A ISTOÉ, padre Jaime negou tudo, e nem sequer admite que
foi afastado da Igreja por má conduta sexual, conforme decreto
da Cúria de 2004. “Saí por divergências
ideológicas”, garante ele. “É tudo mentira,
são calúnias dessa Renilda, que está aperreada.
Eu a conheci em 2002 e nunca estive dentro de sua casa. As batinas
que Renilda diz serem minhas ela deve ter comprado, as fotos são
montagens. Nego tudo”, diz. Agora, a definição
do que poderá ocorrer está com o Judiciário.

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Revista IstoÉ

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Um comentário:

- Al Moroni - disse...

Coisa de louco Adson... que historia.

Mais uma envolvendo a Santa Madre Igreja... continuarei pagao.

Beijos e beijos